Como as religiões reagiriam aos extraterrestres?

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Tempo de leitura: 6 min.

Leia abaixo o interessante artigo por Ed Simon, escrito para o site: religiondispatches.org

Já se passaram mais de duas semanas desde que a conferência de imprensa em Guizhoy, China, anunciou a respeito de uma transmissão de rádio recorrente que pareceu estar vindo de NGC 6809 (um agrupamento de estrelas localizado perto da constelação de Sagitário) não ser um fenômeno natural.

Agora sabemos que há vida não humana inteligente nos confins da nossa galáxia.  Você poderia jurar que o anoitecer sobre a cúpula massiva de São Pedro está de alguma forma diferente, mas ainda parece a mesma como em qualquer outro dia quente e úmido de dezembro em Roma.

O pulso – um ‘bip’ contínuo, com uma sequência de números primos (1, 2, 5, 7, 11, 13…) – foi primeiramente detectado em novembro passado pelo Rádio Telescópio de Abertura Esférica de quinhentos metros (sigla FAST em inglês), e então acompanhado independentemente por outros observatórios mundiais.

E agora nos encontramos no momento da abertura do assim chamado “Vaticano IV” – uma reunião ecumênica sem precedentes de líderes religiosos convidados por Roma pelo Papa Francisco III.  O rumor é o de que o papa irá liberar uma das encíclicas escritas de forma mais apressada e mais significativa da história da Igreja, “Da Vida Extraterrestre”.

Os observadores apontam a chegada em Roma de todos de Gyaltsen Norbu, do líder chinês escolhido do Budismo Tibetano, até o Grã Dastroor da República Zoroastra Persa, bem como representantes do Conselho Mundial de Igrejas.  Há ainda rumores de que o “anti”- Papa Pio XV, da Igreja Católica Americana, poderá chegar mais tarde nesta semana, do Rio de Janeiro, aumentando a especulação de uma reaproximação após décadas de rompimento.

A Igreja Ecumênica dos EUA permaneceu cautelosa, emitindo platitudes sobre como a descoberta aumenta o significado da criação.  Cidadãos da República Cristã do Texas tomam essa transmissão como um sinal de um apocalipse há muito tempo esperado.  Enquanto isso, o Dawkins Chefe da Comunidade Ateísta Secular Inglesa anunciou que a “…descoberta de vida alienígena derruba de uma vez por todas a ideia de um deus criador”.

Mas os cristão estão curiosos para saber ser a encíclica papal irá explicar como a crucificação de Cristo redimiu os Sagitarianos, ou se eles tiveram a necessidade de seu próprio “Cristo alienígena”.

Pelos próximos dias pelos menos o Vaticano permanece em silêncio, enquanto lá no fundo do céu noturno, perto da NGC 6809, ainda pulsa o sinal com números primos.

–Roma, Dezembro de 2055

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O artigo que poderá um dia ser escrito sobre as reações religiosas da descoberta de vida alienígena, é claro, poderá nem parecer à ficção acima.  Mas, deixando a religião de lado, a possibilidade da confirmação de vida extraterrestre é menos remota do que você possa pensar.

Em 21 de maio de 2014, Dan Werthimer, diretor científico do SETI (Procura por Inteligência Extraterrestre), na UC Berkeley, testemunhou perante o Comitê de Ciência, Espaço e Tecnologia do Congresso (EUA) que “o Universo provavelmente está fervilhando com vida primitiva”, algo que foi substanciado pelo anúncio da NASA em 28 de setembro, de que Marte possui água no estado líquido.

Tão empolgante quanto a possibilidade possa ser, Werthimer apontou que o SETI não está trabalhando para encontrar vida primitiva, mas sim usando rádio telescópios para tentar descobrir evidências de civilizações alienígenas avançadas. Mencionando sobre a existência de bilhões de estrelas em nossa galáxia, com bilhões de galáxias no Universo, ele afirmou a probabilidade estatística gigantesca da existência de vida alienígena.

Nas últimas semanas os cientistas descobriram centenas de exoplanetas (fora de nosso sistema solar), vários dos quais possuem condições similares às da Terra.  Com melhorias contínuas em tecnologia, o colega de Wethimer, Seth Shostak disse que “se há sinais de outras civilizações, os terráqueos eventualmente serão capazes de detectá-las”.

Shostak está ainda mais confiante sobre as chances da humanidade confirmar a existência de vida alienígena, declarando que “descobriremos ET dentro de duas décadas”.

Podemos somente imaginar a demanda para a mudança de paradigma teológico imposta por este tipo de descoberta. Pense no modelo heliocêntrico do sistema solar de Copérnico, ou a teoria da evolução de Darwin através da seleção natural.  A confirmação da vida alienígena ter evoluído em outros lugares – especialmente se for vida consciente e inteligente – certamente apresentaria um enorme desafio para qualquer teologia que enfatiza a natureza especial da humanidade.

Recentemente, Chris Bodenner formulou uma hipótese no The Atlantic, de que a luz anormal detectada da estrela KIC 8462852 (que ainda não foi totalmente explicada pelos astrônomos) possa ser o resultado de uma “esfera Dyson”, que é uma enorme cúpula que uma civilização alienígena super avançada poderia construir ao redor de seu sol,  a fim de colher toda a energia do astro.

Se você acredita nos comentaristas de alguns dos cantos mais esotéricos da Internet, a KIC 84682 pode ser a indicação de que logo iremos confirma a existência de vida alienígena.  O que torna este caso diferente é que alguns cientistas cautelosamente insinuaram a mesma coisa. O que Hamlet disse para Horatio é verdade – parece que há mais coisas no céu do que são sonhadas em nossas filosofias.  Ou, como o astrônomo real Sir Martin Rees disse: “Eu tenho a suspeita de que poderia haver vida inteligente lá fora, em formas que nem podemos conceber”.

Então, como podemos conceber as mudanças que tais descobertas radicais possam manifestar nas religiões?

Aposto que a religião não irá desaparecer. No mínimo, a descoberta da inteligência extraterrestre poderá parecer um pouco como no século XVI, quando os europeus começaram a lidar com o fato de que o hemisfério ocidental continha dois enormes continentes, com milhões de habitantes.

Mas, quanto as coisas mais específicas: como poderiam os cristãos manter a eleição especial da humanidade, ou o sacrifício singular de Jesus Cristo no Universo, com inúmeras inteligências alienígenas?  Como poderia o Judaísmo manter a exclusividade da promessa divina aos Judeus?  Como poderia o Islamismo explicar que o Alcorão foi confiado somente aos humanos?

Para ajudar a pensar nestas e outras questões, entrevistei o Dr. Owen Gingerich, professor emérito da Astronomia e História da Ciência, no Centro Harvard-Smithsoniano para Astrofísica (auto-descrito como vindo de uma “tradição Menonita de longo tempo“).  Num e-mail ele enfatizou que “haveria uma real cacofonia de vozes, desde ateístas até evangélicos, até papas, ponderando isto, com muitas ideias novas que causariam muito repensar – note que estas seriam reações humanas locais…”

Entre os tópicos especificamente teológicos que seriam necessários para repensar: a soteriologia (o estudo da salvação humana), a escatologia (o estudo do fim do mundo) e a situação da escritura revelada.

O Padre George Coyne S.J., diretor McDevitt da Filosofia Religiosa e ex-diretor do grupo de pesquisa do Observatório Vaticano, com base em Tucson, Texas – EUA, escreve; “o ‘pecado original’ é um elemento essencial na visão dos teólogos sobre o relacionamento dos humanos com Deus. Os nossos extraterrestres pecaram desta forma?  Deus escolhe livremente para dar a redenção dos pecados aos seres humanos. Ele fez isto também para os extraterrestres?”

E o Irmão Guy Consolmagno S.J. , diretor emérito do Observatório Vaticano, pergunta retoricamente: “Há algum tipo de ‘Adão cósmico’ pré-datando até mesmo a vida na Terra?  Seria o sacrifício redentor de Jesus Cristo suficiente para todo o Universo?  Haveria uma história paralela de salvação em outros planetas?…  Seriam os planetas alienígenas vistos como territórios de missão?  Você batizaria um alienígena?  Aliás… você ordenaria padre um alienígena?”

Através de um e-mail, Barouk El-Baz, diretor do Centro para Percepção Remota da Universidade de Boston, e geólogo da NASA que selecionou os locais de pouso das missões Apolo, bem como ex-conselheiro científico para Anwar Sadat, disse que “a reação das comunidades Islâmicas seria bem como as de outros. Eu presumo que seria uma mistura de assombro, perplexidade e fascínio… o que poderíamos descobrir lá fora seria uma adição à maravilhosa vida na Terra”.

Embora muitos pensadores religiosos iriam abraçar o desafio e a empolgação de tal evento, outros provavelmente duvidariam ou rejeitariam a evidência científica – como com o persistente criacionismo, por exemplo.

É possível que alguns argumentariam que os alienígenas sejam demônios, ou algum tipo de fenômeno sobrenatural.  Poderíamos ver um aumento na associação dos assim chamados “cultos OVNI”, que podem ver os alienígenas (especialmente se forem tecnologicamente superiores) como figuras de veneração.  Grupos, tais como os raelianos (fundado pelo piloto de corrida francês, que uma vez abriu uma “embaixada alienígena” em Israel) poderiam ver nisso uma vantagem.  Poderia haver um aumento nos adeptos do Hinduísmo, Budismo, Taoismo e assim por diante – os quais podem ser vistos como sendo mais congruentes metafisicamente e cosmologicamente com o novo mundo, do que as fés abraâmicas.

Mas talvez o melhor experimento pensado sobre a ‘religiões após contato’ viria da literatura.

Autores de ficção científica têm por muito tempo estado interessados nas implicações tanto da crença quanto daqueles que acredita num Universo que é menos vazio do que aparenta.

O romance de 1996, de Mary Doria Russel,  The Sparrow, conta a terrível jornada do padre Emilio Sandoz, no ano de 2019, até o planeta Rakhat, e o inquérito das Nações Unidas que seguiu seu retorno em 2059.  Sandoz tragicamente descobre que sua missão é baseada numa má interpretação muito humana e falha da cultura extraterrestre.

O escritor holandês, Michael Faber, aborda um assunto similar em seu trabalho de 2014, The Book of Strange New Things, que segue um missionário britânico, o qual viaja para o planeta Oásis.  O missionário rapidamente descobre a impossibilidade de traduzir a natureza metafórica e alegórica da fé religiosa dos seres alienígenas, que nunca viram, por exemplo, um peixe.

Uma das histórias mais emocionantes sobre religião e ciência é a obra de Arthur C. Clarke, “The Star“, publicada em 1956.  O protagonista é um padre jesuíta que também é cientista, numa expedição interestelar que descobre os restos de uma civilização destruída um milênio antes, numa supernova.  Clarke relata a fé profunda do sacerdote, suas intenções para com a tripulação ateia da nave, e também sua profunda confiança na ciência.  Eles descobrem que antes da aniquilação da cultura alienígena, eles criaram uma arca contendo a totalidade de sua sociedade – uma civilização criativa, supremamente pacífica e artística.  Mas quando calcularam a data da explosão da estrela, o jesuíta faz uma terrível descoberta.

Em desespero, o sacerdote  grita: “Deus, há tantas estrelas que Você poderia ter usado. Qual foi a necessidade de enviar estas pessoas ao fogo, para que o símbolo de sua partida poderia brilhar acima de Belém?”

Seja esta estória uma parábola ateia, ou uma medição sobre a vulnerabilidade da fé, ela traz consigo uma questão que os religiosos encontram ao terem os extraterrestres em foco.  Como aqueles pensadores religiosos que têm endereçado a possibilidade da inteligência extraterrestre, Clarke aqui parece sugerir que as questões podem ser tão importantes quanto as respostas.  E é nestas questões que abraçamos o mistério e a maravilha – o espanto que a religião e ciência compartilham.

– Ed Simon

Fonte: religiondispatches.org

Colaboração: Gabriel Lisboa

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